Antártida, uma aventura contemplativa
Texto e Fotos: Heitor e Silvia Reali
Esqueça os estereótipos dessa fronteira, pois a Antártida está muito além do frio e da neve. É impossível captar em cliques fotográficos o sublime, a amplitude e mais, reproduzir a complexidade daquela beleza. Nessa paisagem minimalista – montanhas brancas, mar e céu – o cenário é sempre cambiante. Parece traquinagem da natureza, pois conforme o ângulo dos raios solares, mudam as cores oceânicas, as do céu e do gelo. Tonalidades de verdes e azuis predominam nas águas geladas. Cobalto e tons cinza para o céu; para as montanhas, marfim riscado de negro vulcânico. O dourado surgirá, para desaparecer logo em seguida, dependendo do humor do sol. O ar é seco, e a paisagem marinha devido aos icebergs é um dos mais atraentes espetáculos da natureza. De dimensões e formas inusitadas eles captam os efeitos do sol e os reverberam ao seu redor. Sua visão vem sempre acompanhada dos mais belos adjetivos que um idioma pode produzir. Desta geografia emana tal fascínio que beira a grandeza de uma viagem épica.
A carta na manga da viagem se concentra nos desembarques em terra. Diante de um ambiente à primeira vista hostil, ‘curiosamos’ como um naturalista ou um explorador que palmilhou a mesma região nos séculos passados. E somos arrebatados pelo mesmo deslumbramento ao aportar num mundo inexplorado, desconhecido, farto de beleza. A paisagem ali não é diferente do tempo desses primeiros aventureiros.
Quando entramos em contato com a fauna local, então temos certeza de que estamos diante de uma obra-prima da natureza. As boas-vindas são dadas por pinguins reis, pelos pequenos gentoos ou os macaronis, aqueles com tufos dourados na cabeça, assim como pelas gaivotas, petrel-gigante, skuas, albatrozes, focas, leões-marinhos e baleias. Depois de alguns dias eles se tornam velhos conhecidos, e avistá-los produz momentos de pura alegria. Mas é a natureza, desde sempre, que manda nesse território. As mudanças climáticas são rápidas – em menos de cinco minutos o céu que era azul e a claridade se fecham sob nevascas – mas ninguém quer arredar o pé dali. A aura de mistério que cerca o continente explica sua forte atração sobre tantas pessoas.
O itinerário dos cruzeiros privilegia glaciares, fiordes, estreitos, ilhas e pitstop nas estações cientificas da Polônia, quase ao lado da brasileira Comandante Ferraz que está em ruínas devido ao incêndio ocorrido há três anos. Visitam-se ainda as estações da Argentina, do Chile e da Inglaterra que fica em Port Lockroy, hoje transformada em museu. Todas na Península Antártica.
Para dar suporte científico à viagem, durante a navegação, são proferidas palestras e exibidos filmes sobre o continente. “É legal ouvir as conferências e as histórias dos exploradores. Isso cria um clima de aventura e de interação com o local”, diz o turista inglês Harold Finn, 67. Ele, por sua vez, tem muito valor. Mesmo paraplégico, não deixou de desembarcar nenhum só dia. Sua capacidade de superação me emocionou.
Outras belezas da Antártica não estão na paisagem, mas nas histórias de conquistas e derrotas vitoriosas dos primeiros exploradores. A mais impressionante é a da expedição fracassada de Sir Ernest Shackleton (1874-1922), que pretendeu cruzar esse continente a pé em 1914. Esse relato se lê como fantasioso, mas é pura realidade. “Antártica é um lugar que cativa sua imaginação e sua alma.” As palavras de Shackleton ecoam na mente de cada um que se dá o privilégio de visitar esse continente. Paraíso da humanidade. Razão pela qual a aventura ali se resume na contemplação. É a paisagem que importa.
Diário de bordo
Até pouco tempo a imaginação era o único bilhete para se chegar lá. Hoje a jornada é possível. Mas, antes é preciso voar para a região conhecida como fim do mundo. Ali, de Ushuaia, na Argentina, ou de Punta Arenas, no Chile, é só escolher um navio para a mais remota fronteira da natureza – a Antártida.
De outubro até meados de março, embarcações cruzam o mítico Cabo Horn e rumam em expedições de sete dias, ou mais, para a Península Antártica. Vale a pena optar pelo fim da temporada quando os descontos nas passagens costumam chegar até 50%.
Quem leva: climbtur.br, (tel. 11- 5052-6305)