Turismo perigoso
Será que Aécio e seus acólitos pensaram que seriam recebidos em Caracas como salvadores da pátria, com banda de música e tudo?
Afinal, o que um grupo de senadores brasileiros, capitaneado por Aécio Neves, foi mesmo fazer na Venezuela? Alternativa A – Foi libertar os presos políticos; Alternativa B – Foi destituir Maduro e empossar Aécio na Presidência da República; Alternativa C – Foi fazer um passeio turístico, pago com recursos públicos, para virar notícia internacional. Bastou, porém, a manifestação de uns poucos venezuelanos nacionalistas, durante um engarrafamento, para que eles retornassem correndo para o Brasil com o rabo entre as pernas. E aqui voltassem a cantar de galo, fazendo ameaças ao governo brasileiro que, segundo eles, deveria declarar guerra à Venezuela por conta do vexame.
Na verdade, tudo não passou de uma grande palhaçada, com roteiro digno dos filmes dos três patetas, conforme lembrou o escritor Fernando Morais. Será que Aécio e seus acólitos pensaram que seriam recebidos em Caracas como salvadores da pátria, com banda de música e tudo? Que povo gosta que estrangeiros se intrometam em seus assuntos internos? Será que esses senadores não têm o que fazer no Brasil? Com tantos problemas por aqui o que eles tinham de fazer na Venezuela? Eles vivem criticando o governo por causa dos gastos e, no entanto, fizeram um passeio pago com dinheiro público. Quanto custou essa brincadeira aos cofres públicos?
O “valente” Aécio, que desistiu da sua missão libertadora diante de um pequeno grupo de manifestantes, afirmou ao voltar que “nós vamos exigir uma posição dura do governo brasileiro”. E ameaçou: “Se não ocorrer nós vamos fazer as retaliações necessárias dentro do Congresso Nacional”. Engraçado: eles não pediram a opinião da presidenta Dilma, com relação à viagem, e agora querem que ela brigue com o presidente Maduro porque um magote de venezuelanos os botou pra correr. E já chegaram ao cúmulo de ameaçar expulsar a Venezuela do Mercosul por causa disso. Será que o deputado Carlos Sampaio, que questionou uma escala técnica da Presidenta em Lisboa, vai questionar os gastos do passeio?
Não é difícil perceber que Aécio e seus escudeiros inventaram essa viagem para criar um factoide, com o apoio sempre valioso da grande mídia, que não mede as consequências do seu noticiário quando o objetivo é atingir o governo. Chegaram, inclusive, a noticiar que o governo de Maduro havia vetado o desembarque dos senadores em Caracas, o que depois foi comprovado ser uma deslavada mentira. Aparentemente os grandes veículos de imprensa do nosso país, cujos fundadores primavam pela seriedade e credibilidade do seu noticiário, hoje perderam a vergonha e os escrúpulos, usando o seu poder para atingir, a qualquer preço, seus objetivos políticos e econômicos. Não importa se a notícia é verdadeira ou falsa, desde que atenda aos seus interesses.
Depois desse vexame, pergunta-se: o que será que Aécio e seus caninos seguidores vão inventar para um novo passeio que lhes assegure espaço no noticiário? Aqui vão algumas sugestões: que tal uma viagem à Síria para combater o islamismo? Ou ao Egito, em apoio ao presidente que, embora eleito democraticamente, foi derrubado e condenado à morte na forca? Ou à Ucrânia, para combater os russos? Ou, quem sabe, a Israel, para defender o Estado palestino? Talvez fosse mais fácil ir aos Estados Unidos, defender não apenas a aceleração do processo de reaproximação com Cuba como, tambem, o fechamento da base militar de Guantânamo. Em última análise certamente seria bem mais barato ir às favelas do Rio de Janeiro negociar uma trégua entre as facções criminosas para acabar com os conflitos e mortes.
De qualquer modo, a fracassada viagem teve o seu lado positivo: Aécio e seus escudeiros já sabem que não são tão poderosos como imaginam e, portanto, não podem se intrometer na vida alheia. Na verdade, tiveram até sorte na aventura, porque os manifestantes venezuelanos se contentaram apenas em esmurrar a van. Se eles fossem dominados pelo mesmo ódio que consome alguns brasileiros imbecis, que pregam a morte de Jô Soares apenas por ter entrevistado a presidenta Dilma Rousseff, o desfecho do passeio turístico poderia ter sido trágico. Ainda bem que os venezuelanos não leem a imprensa brasileira…