Aparição de ruínas revela memórias de moradores de cidades inundadas na Bahia
O vento forte movimenta as águas no lago de Sobradinho. E as ondas que se formam quebram diante dos degraus da porta de uma das casas tomadas pelo rio São Francisco após a construção da barragem, no final da década de 1970. De pé sobre o alicerce quebrado, Carlos de Castro, conhecido como Cacá, 63 anos, lembra dos dias em que frequentou o local, na antiga cidade de Casa Nova (BA). Ali morou o seu sogro e sua atual esposa, à época namorada.
Nos quase 40 anos da construção da barragem, esta é a primeira vez que as ruínas de Casa Nova aparecem devido à redução do nível do lago. É possível distinguir alguns detalhes das casas, como as pias de lavar roupa, o azulejo branco e as caixas d’água.
Marcello Casal Jr/Agência Brasil
A falta de chuva na nascente do rio Francisco, no norte de Minas Gerais, tem comprometido o reservatório. A chuva irregular já dura, pelo menos, quatro anos e o resultado é o mais baixo nível de água que já se viu nas quase quatro décadas de Sobradinho. No último dia 3, o volume do lago chegou a 1,11% da sua capacidade.
“Estar no lugar onde você nasceu e se criou faz passar um filme na cabeça”, lembra Castro, que hoje é secretário da Agricultura e do Meio Ambiente do município.
Ele lembra do nome dos moradores de todas as casas vizinhas e aponta para o muro do cemitério. A alvenaria de alguns jazigos hoje está aparente.
Em Remanso (BA), o tempo parece voltar atrás quando as águas retidas na barragem de Sobradinho assumem o antigo curso natural do Velho Chico. O nível da água baixou e se afastou cerca de 7 quilômetros da margem, revelando o antigo cais da cidade. Essa é também a distância entre a velha e a nova Remanso.
Marcello casal Jr/Agência Brasil
“Aqui era onde passavam os vapores. O pessoal dessa região que ia para São Paulo pegava um vapor até Pirapora [município mineiro que fica às margens do rio São Francisco], passava oito, dez dias viajando, e de lá pegava o trem para São Paulo”, lembra Pedro Alves da Costa, 61 anos, chefe de gabinete da prefeitura do município. Ele morava em Sento Sé e se mudou com a esposa em 1975 para Remanso antiga, onde abriu um comércio.
Hoje, o mesmo cais voltou a ser usado. Do local, partem as embarcações que vão para cidades que ficam em volta do lago. O baixo nível das águas no trecho, que fazem aparecer bancos de areia, vem dificultando as viagens. “Antes a gente passava direto aqui”, diz José Messias, apontando para a margem oposta do lago, enquanto preparava sua embarcação rumo a Sento Sé. “Agora a gente arrodeia lá por baixo. A viagem demora uma hora e pouco, duas horas a mais.”
Em Remanso (BA), o tempo parece voltar atrás quando as águas retidas na barragem de Sobradinho assumem o antigo curso natural do Velho Chico. O nível da água baixou e se afastou cerca de 7 quilômetros da margem, revelando o antigo cais da cidade. Essa é também a distância entre a velha e a nova Remanso.
Marcello casal jr/Agência Brasil
“Aqui era onde passavam os vapores. O pessoal dessa região que ia para São Paulo pegava um vapor até Pirapora [município mineiro que fica às margens do rio São Francisco], passava oito, dez dias viajando, e de lá pegava o trem para São Paulo”, lembra Pedro Alves da Costa, 61 anos, chefe de gabinete da prefeitura do município. Ele morava em Sento Sé e se mudou com a esposa em 1975 para Remanso antiga, onde abriu um comércio.
Hoje, o mesmo cais voltou a ser usado. Do local, partem as embarcações que vão para cidades que ficam em volta do lago. O baixo nível das águas no trecho, que fazem aparecer bancos de areia, vem dificultando as viagens. “Antes a gente passava direto aqui”, diz José Messias, apontando para a margem oposta do lago, enquanto preparava sua embarcação rumo a Sento Sé. “Agora a gente arrodeia lá por baixo. A viagem demora uma hora e pouco, duas horas a mais.”
Marcello casal jr/Agência Brasil
Ainda segundo ele, as populações das cidades foram pegas de surpresa. “Teve gente que gostou da realocação, pois vivia numa casa que não era rebocada, não tinha piso, e mudou para uma casa com uma infraestrutura melhor. Mas teve quem não concordou, como as pessoas que moravam à beira do rio. Além disso, havia dúvidas sobre as indenizações. Ainda hoje há ações na Justiça questionando isso”, relata Almeida.
Além da surpresa, a ideia de que as cidades seriam inundadas gerava medo, especialmente nos mais velhos. O dia em que a água chegaria era comparado ao dilúvio, relatado na Bíblia.
Cidade Nova- Seca expõe ruínas de cidades inundadas para a construção da barragem de Sobradinho, no fim da década de 1970 (Marcello Casal jr/Agência Brasil)
Remanso – Seca expõe ruínas de cidade alagada na Bahia para construção do reservatório de Sobradinho, o maior do Nordeste ( Marcello Casal jr/Agência Brasil)
Sobradinho – A Usina Hidrelétrica de Sobradinho tem capacidade total de 1050 megawatts, mas com a falta de água só tem sido possível gerar cerca de 160 megawatts (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Remanso – Com a falta de chuva na nascente do Rio São Francisco, o reservatório de Sobradinho vive a maior seca de sua história (Marcello Casal jr/Agência Brasil)
por Edwirges Nogueira, da Agência Brasil